Por que há questões que são melhor respondidas com novas indagações!

sexta-feira, 4 de junho de 2010

A mãe que eu fui...


A mãe que fui tirava um sábado por mês, às vezes, 15 dias, para lavar os brinquedos. Lavava um por um, com escova e detergente, lavava também a caixa de brinquedos. Deixava-os todos expostos ao sol e monitorava: extinguindo-se a última gota d´água, voltavam para dentro, para que a poeira não os atacasse! Era algo que eu fazia com grande empenho e dedicação, gostava daquilo.

A mãe que eu fui frequentava o andar de baixo da casa com filho dormindo no de cima, mas jamais conseguiu subir as escadas com filho sozinho no de baixo. Vai que alguém o roubava? Tesouro precioso!

A mãe que eu fui levava e buscava filho na escola e não abria mão do ritual. Não o delegava a ninguém. Chegava 15, mais tardar 10 minutos antes do horário da saída e o aguardava, feliz, conversando sobre o tempo frio/ quente com outras mães, até ouvir o famoso mããããeeee, comprido e surpreso, como se aquele dia fosse o primeiro, e eram todos tão únicos quanto repetitivos.

A mãe que eu fui saiu da maternidade com seu pacotinho no bebê conforto, comprado no 5º mês de gestação, curtindo o manual de instruções junto com marido. Trocou o bebê conforto pela cadeira adequada aos 7 meses do pequeno, e registrou na memória este mágico momento, de um princepezinho em seu trono, olhando o mundo do alto, pela janela do carro, pela primeira vez.

A mãe que eu fui não andava de carona. Não dava carona para mais do que duas pessoas, por que não abria mão da cadeirinha nem para ir à padaria da esquina. A mãe que eu fui não abria mão da segurança do filho. E passava por neurótica ou antipática, na certeza de fazer o melhor.

Então vendi meu carro e agora ando de carona, com filho no colo, ao lado, solto no banco de trás de alguém.
Coloquei filho na condução, sendo transportado por um desconhecido no qual tive que confiar da noite para o dia, simplesmente por que foi indicado por alguém. O transporte atrasava com frequência a buscar e a mãe que eu fui contorcia-se em casa, aguardando que chegassem, enquanto a lua chegava na frente.

A mãe que eu fui sabia o nome de cada amiguinho da turma, sabia quem era novo e os mais antigos, os mais queridos e os desafetos. A mãe que eu fui paparicava professoras, não perdia reunião de pais e adorava o convívio com a escola.

A mãe que eu sou teve que trocar filho de escola de repente, procurou pouco (e deu sorte, graças a Deus). Ainda não conhece muitos de seus amigos, não busca mais na escola, delegou a tarefa à vovó, sabe das histórias que a vovó conta ou que filhote conta "do seu jeito".


A mãe que eu fui tinha o telefone da creche registrado no celular e num imã de geladeira, mas nem precisava pois sabia o número de cor e salteado. 


A mãe que eu sou esqueceu de mandar a pasta com trabalhinho do filho e precisou procurar na internet o  telefone da escola para avisar. A mãe que eu sou ainda não anotou este número em lugar nenhum...

A mãe que eu sou concorda com a lei das cadeirinhas, mas não sabe o que fará quando precisar de caronas. Não poderei mais pegar carona com o filhote? Agora só de ônibus? A mãe que sou não acredita que ônibus é um transporte seguro. A mãe que sou precisa adaptar-se às novas situações.

A mãe que sou sente saudades da mãe que fui. Estressada? Cansada? Sobrecarregada? Sinto que estes adjetivos me afetam mais hoje do que no tempo em que podia cuidar do meu filho da maneira que acho mais adequada. Quando eu sentia que podia protegê-lo, preservá-lo. Sinto saudades de ser assim e é o que busco neste momento. Não entendam como culpa, não me sinto culpada. Sei que no momento é o que posso oferecer, mas como já estive em outra posição sei que pode ser melhor, e quero voltar a isso.

Quando estudei percepção de riscos não imaginei que minha vida daria uma volta que me colocaria em posição experimental. Agora entendo que não é apenas uma questão de perceber os riscos; que negligenciar riscos é algo muito mais profundo do que podemos explicar num trabalho científico. Que riscos e perigos só podem ser percebidos/ prevenidos a partir de determinada classe social (econômica, na verdade). Fui a campo, estudei, li tanto, escrevi tanto e a vida me ensinou muito mais. Já aprendi, agora pode fechar o capítulo, tá bem? Quero ir para o próximo.

Se não entendeu, me perdoe, é um desabafo que eu precisava fazer à vida.

Beijos a todos,

Tati.

16 comentários:

She disse...

Oi minha querida, eu adoro os seus desabafos, pois são de uma sinceridade impressionante, pq vc se desnuda de qq preconceito que possa vir em cima de vc, sem medos e se abre tal como vc é, e isso é lindo e admiro. E acredite por mais insegura que vc possa se sentir nestes desabafos eles mostram uma enorme sabedoria, viu?! Fique bem e beijo, beijo! ;)
She.


PS: Obrigada pelo up que me deu lá no meu post agorinha, adorei!

Cris França disse...

ah se entendi Tati...cada linha...

Também há diferenças entre a mãe que eu sou e a mãe que eu fui.

Mas somos sempre melhores em algumas coisas e piores em outras, filho não precisa de mãe perfeita demais, nem é bom pra eles, filho precisa mesmo de mãe feliz...

e nesse ponto tenho certeza que o Bê tem a melhor mãe do mundo.

beijos minha amiga! e um abração enorme,...

p.s. - se serve de consolo depois de 5 anos mandando a Julia pra escola desde os 4 meses, semana dessas ai atrás esqueci de mandar a toalha de banho dela, e levei uma dura dela mesma, porque havia esqueci, morri de culpa, mas passou, tudo passa quando o amor é maior amiga. +bjs

disse...

Simplesmente encantadora a forma como você descreveu aqui algumas fases do ser mãe. É bem assim mesmo, e nem sei na verdade aonde é que perdemos o controle na passagem do fui e sou, acontece tão instantâneo. Mas é mágico e lindo sentir e vivenciar tudo isso, contribui muito na decisão de como melhor ser a mãe do amanhã. Bjos no coração!

Desconstruindo a Mãe disse...

Oi, identificação em gênero, número, grau e intensidadde dos sentimentos, pois com o segundo filho não consigo fazerf tudo que fazia coma primeira... Culpa? Talvez uma certa libertação, talvez um certo conformismo por não dar conmta de tudo, mas sigo tentando sempre dar o melhor de mim!

Força na peruca, guria, que não tá morto quem peleia!

Beijo!
Ingrid

Glorinha L de Lion disse...

Tati, espetacular esse seu texto! Mãe já nasceu com culpa e nem dá pra ser diferente, pois até a mãe que não trabalha fora se culpa por alguma coisa tb...isso é inerente à condição materna...e como diz a Cris, o importante é ser feliz e saber que fez o melhor que pode...se errou, foi tentando o melhor, se não pode fazer, tentou...e o Bê vai saber que seu amor por ele é maior que qq sentimento de culpa ou omissão. Beijos.

Glorinha L de Lion disse...

Tati, espetacular esse seu texto! Mãe já nasceu com culpa e nem dá pra ser diferente, pois até a mãe que não trabalha fora se culpa por alguma coisa tb...isso é inerente à condição materna...e como diz a Cris, o importante é ser feliz e saber que fez o melhor que pode...se errou, foi tentando o melhor, se não pode fazer, tentou...e o Bê vai saber que seu amor por ele é maior que qq sentimento de culpa ou omissão. Beijos.

Isadora disse...

Ai Tati fui lendo o que você escreveu e fui me vendo. Acho que nós mães, sempre podemos ver como fomos e como somos agora.
Consigo não perder uma reunião de pais, mas não consigo estudar com a minha pequena. Tarefa delegada para a avó.
Vou tirar dez dias de férias e sabe o que farei: serei mãe, já que ao longo da semana sou mãe de final de semana. Ufa! Aproveitei para desabafar também.
De qualquer forma acho que estamos fazendo o nosso melhor.
Um beijo

Anônimo disse...

Tenho certeza de que você é uma mãe maravilhosa. Sabe, os filhos crescem e as dificuldades também, mas por fim, damos o melhor de nós e é isso o que importa. Beijos na sua linda alma!

Anônimo disse...

Tati querida, você tem razão, quando diz que "os riscos e perigos só podem ser percebidos e prevenidos a partir de determinada classe social (econômica, na verdade)." Infelizmente é bem assim. Numa certa fase de minha vida, também vieram a mim essas percepções. Então, minha filha, xô culpa, segui meu caminho, trabalhando, estudando, dando um jeito nessa tal de classe social, enfim essas coisas. Foi um sufôco, acredite. Eu mal conseguia ver minha familia. Vivia cansada, um trapo. Mas, foi muito bom, consegui amparar meus filhos e ajudá-los, mais tarde, a engrenar seus sonhos. E hoje em dia, eles enchem o peito e dizem, minha mãe e meu pai isso e aquilo. Mas noto que "minha mãe" está bem ali nas lembranças deles!!! Claro, pude contar com meu marido, ah, se não fosse ele! Ali, ao meu lado trabalhando e me apoiando. E minha mãe e minha avó também! Tenho muito que agradecer. Conto isso querida, porque pode servir de alento em tua vida, não se culpe, não vale a pena. A vida é dinâmica, todos mudam, nossos filhos também. Creia, eles não exigem todo nosso sangue... só um pouquinho!!! rsrs. E tu achas que eles são bobos? hehe. Quem nos cobra é sociedade, que, não nos dá absolutamente nada!!! Nossos filhos nos querem bem vivinhas para as trocas de amor. Pense bem nisso. Encaminhe sua vida como é possível, com entusiasmo. Bjssssssss

Françoise disse...

Sua maneira de escrever me encanta.
Você é uma mãe de tirar o chapéu mas sei que nós meros mortais, nos cobramos muito enquanto mães, pra ter ideia me sinto mal até hoje por não ter conseguido amamentar a Bia, mas nosso amor é muito maior que qualquer deslize.
Seu Bê é muito feliz, é só olhar pra carinha dele.

Beijos e bom domingo.

Unknown disse...

Achei sensacional a frase da Cris França: filho não precisa de mãe perfeita, precisa mesmo de mãe feliz...Hoje você se acha menos dedicada, menos presente? Saiba que o que vale não é a quantidade de tempo que você tem com ele, mas a qualidade desse mesmo tempo.Se ao invés de passar um dia inteiro reclamando, cansada, perdendo a paciência, você passar uma hora conversando e brincndo, já terá valido a pena. Não se culpe. Você dá o seu melhor, hoje, prá poder lhe dar uma mãe melhor amanhã. Beijinhos de mãe.

Mahria disse...

Eu entendi sim. Porque já fui e hoje sou mãe semelhante. A diferença é que EU me sinto culpada...


P.S
Parabéns, pela indicação no Blog UM POUCO DE MIM.


Bjs
Mah

Beth/Lilás disse...

Tati, minha linda, somos todas iguais, com o mesmo sentimento de achar que não fez bem feito, que poderia fazer melhor, que tá faltando alguma coisa e por aí vai.
Mas, na verdade, somos mesmo muito cuidadosas e amorosas, talvez por isso tenhamos tantos sentimentos desencontrados.
beijos cariocas

TECA disse...

Oi linda,adorei seu blog demais.Cheguei até aqui por indicação da Elaine de Um pouco de mim(que adoro também,o blog e a Elaine,pessoa de uma humanidade maravilhosa).
Tati,seu postfalando da mãe que foi e da mãe que é hoje mexeu muitíssimo comigo porque virada de situação na vida eu passei e também tive que me adaptar minha querida e saiba que você é uma mãe maravilhosa em qualquer situação porque essa centelha de amor de seu coração nada poderá apagar.
Um beijo para voce e fique bem.
TECa

Janete Pinho disse...

Oi Tati,
Acho que todas as mães que leram seu post, se identificaram com cada palavra que voces escreveu. Este sentimento de que poderiamos fazer mais e melhor, e que tá sempre faltando alguma coisa e que só conseguimos realmente relaxar depois de ver todos os filhotes dormindo em suas camas- limpos alimentados e seguros (e não importa a idade que eles tenham).
Adorei o jeito como você escreve. Parabéns pelo blog!
Um grande abraço,
Janete

Bordados e Retalhos disse...

É um desabafo lindo, cheio de verdade, de coisas e situações que vivi também. Hoke me pergunto que mãe eu sou e as vezes me assusto com a resposta.Mas como já escrevi outro dia sou a mãe que sou, a mãe que posso ser e não quero mais me estressar com isso. Tenho certeza que as duas mães, a que foi e a que é, estão aí se equilibrando dentro de você para fazer o melhor pelo Be. Bjs, vc escreve sobre a vida lindamente.